Jornalista, comunicador, autor, diretor, apresentador, roteirista, escritor e (ufa!) até engenheiro. Muitas são as facetas de Marcelo Tas, conhecido, sobretudo, por seus trabalhos na televisão. Quem não se lembra do memorável Professor Tibúrcio, da série infantil “Rá-Tim-Bum”? Mas um dos assuntos aos quais ele mais se dedica é educação. Tas tem um canal no YouTube sobre o tema e também se descobriu professor recentemente. Confira no bate-papo:
"No dia em que a criança falar com vontade que quer ser um professor, eu acho que estaremos no caminho certo."
Muitas pessoas lembram de você pelas aparições em TV, mas, na verdade, seu leque de trabalhos é extenso. O que te levou a criar um canal sobre educação no YouTube?
O meu público que cobrou isso, e foi justamente ouvindo a minha rede que eu descobri o óbvio. Minha vida toda eu trabalhei com conteúdos voltados para a educação, mas eu não tinha um ambiente para tratar de conteúdos exclusivamente de educação. Foi assim que nasceu o canal “Descomplicado”, ligado a descomplicar assuntos, que traduzimos em vídeos de cerca de três minutos.
Qual é o critério para escolher o tema de cada vídeo?
Esse critério vem do público. Essa é uma rotina de quem estiver interessado em navegar bem na era digital. Seja você dentista, seja político, seja professor, o que você faz é alterado o tempo todo pela nossa convivência em rede. É uma oportunidade de nos atualizarmos e oferecermos algo melhor, e também de responder melhor às necessidades de quem você atende: eleitor, aluno, namorado.
Você também dá aula para o ensino superior. Como é o Marcelo Tas professor?
É a oportunidade que eu tenho de ser alguém mais próximo de quem sou de verdade. Tenho muito prazer em dar aulas, sou filho de dois professores, tenho amor pela educação desde o berço, e isso me fez também um professor rigoroso. O contato em sala de aula é longo, ficamos horas juntos e também permanecemos conectados, continuamos trocando ideias, dúvidas, informações. E fico muito feliz de perceber que bem mais do que eu ensino aos meus alunos, eles me ensinam também.
Você dá aula de inovação. Na sua opinião, qual é a maior dificuldade para inovar?
A mentalidade. Nosso desafio é transformar a forma como muita gente pensa. Muita gente vai atrás da pista falsa que é a tecnologia, acreditando que é só mudar o computador, o tablet, mas o difícil é vencer a nossa resistência interna, de olhar para isso sem preconceitos, com coragem e sem deslumbramento, sem achar que é a salvação. É uma tarefa bem difícil, mas que acho fantástica. Meu curso é sobre a transformação da mentalidade, como olhar para essa aceleração e perceber as oportunidades e também as armadilhas, e poder nos dedicar oferecendo tempo precioso para navegar bem nessa nova era.
Recentemente, você criticou a falta de investimentos nas pesquisas científicas no Brasil. Como você vê as consequências disso?
A pesquisa científica é como preparar a terra para plantar. Se você não fizer agora, quando aparentemente ainda não está acontecendo nada, quando você resolver fazer, não haverá tempo de resposta certo. É aí que está a minha ocupação, que eu já assumi. A importância das pesquisas é crucial. É só a gente olhar para quem faz isso direito, como é o caso da China, da Índia e até de países com muito menos dinheiro. O resultado se reflete no nível educacional da população e também nos resultados econômicos. Todas essas variáveis têm a ver com a nossa era.
Mais uma vez o Brasil não atingiu a meta do ensino médio no Ideb. O que você acredita que tem contribuído para resultados ruins do ensino médio brasileiro?
Sem dúvidas, o descaso com o médio e longo prazos. Nós temos aí uma sucessão de governos que prometeram recursos e prioridades para a educação, mas os investimentos não ocorreram da forma estruturada. O que vimos foram algumas iniciativas boas, mas não há um planejamento estratégico, que olhe para o horizonte macro, para o desafio gigante que nós temos. E isso reflete no resultado. Temos picos de excelência, ganhamos medalhas em olimpíadas de matemática por aí, temos gente muito boa lidando com inovação, temos alunos de periferia que vão para Harvard. Poxa, o Brasil tem potencial e talentos, mas não temos uma preparação da terra, como já falei aqui, em que antes precisamos preparar o terreno com um bom cuidado, tirando as ervas daninhas, com adubo. Não temos isso, como acontece em países conhecidos como China, Coreia do Sul e Argentina. Os resultados dos nossos vizinhos são extremamente diferentes dos nossos, mesmo tendo esse potencial gigante, com gente muito dedicada, não tem valorização. E isso não é só ligado ao salário, mas também à falta de prestígio. A profissão do professor ainda é muito desvalorizada. É fácil termos um sonho no Brasil: o meu é de que as crianças desejem ser professores. No dia em que a criança falar com vontade que quer ser um professor, eu acho que estaremos no caminho certo. O que nós temos são professores desvalorizados, desmotivados.
Você é muito ligado nos avanços da tecnologia, em inteligência artificial e no uso de redes sociais. Você acredita que um dia podemos acabar como em um episódio da série de ficção científica “Black Mirror”?
De certa maneira, a gente já vive “Black Mirror”. Vários episódios da série são quase um jornal do dia, é um documento real do que já vivemos. A ficção nos ajuda muito a viver a realidade, e eu falo muito da consciência que devemos ter, de como há um enorme potencial de a gente simplesmente ficar hipnotizado, navegando à deriva. Gosto de levantar exemplos que não são sinais tão terríveis do que pode acontecer com o avanço da tecnologia. Faço questão de lembrar que as oportunidades são também gigantescas, e cabe a nós aproveitar.