Quais são os desafios para um novo ensino médio?

Mudanças no ensino médio trazem desafios para as escolas, que devem dialogar com a realidade dos jovens

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Foto: Pixabay
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Uma etapa de ensino extremamente desafiadora, o ensino médio está em processo de mudança. Particular ou pública, toda escola com turmas desse nível precisa se adaptar a uma nova realidade de formação, cuja proposta é, ao mesmo tempo, garantir aprendizagens comuns e oferecer mais possibilidades de escolha aos alunos.

O novo ensino médio chega ancorado à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), um documento norteador para a elaboração do currículo das escolas. É de lá que são retiradas as referências para definir o que todos os alunos precisam aprender, e também onde se encontram os itinerários formativos que darão mais flexibilidade ao processo de ensino-aprendizagem.

“O que vem sendo desenhado é superpositivo e vai ao encontro do que muitos países desenvolvidos fizeram nos últimos anos. Hoje, o ensino médio não conversa com a realidade do jovem, não conversa com o mundo onde vivemos. São 13 disciplinas estruturadas em que o jovem tem pouca ou nenhuma possibilidade de escolher”, aponta Thaiane Pereira, coordenadora de projetos da organização Todos pela Educação.

Pelas novas regras, os itinerários serão ligados a quatro áreas de conhecimento – Matemática, Linguagens, Ciências Humanas e Ciências da Natureza – e à formação técnica e profissional. A reestruturação da arquitetura curricular vai garantir, além da parte comum a todos os estudantes, múltiplas possibilidades de criação, conforme o interesse do estudante.

“Tanto para escolher o que vai estudar, quanto mais possibilidades de combinação entre as áreas, e não mais por disciplinas”, valoriza Thaiane.

Mais atividades

A coordenadora do Todos pela Educação destaca, ainda, que no novo modelo os alunos vão ficar mais tempo na escola, terão novas disciplinas e atividades eletivas para o desenvolvimento de habilidades socioemocionais.

Esse é o lado positivo, segundo Thaiane, mas o prazo de três anos para implementação acende um sinal de alerta. Há muito trabalho a ser feito, da infraestrutura de escolas à formação de professores. “Não faz mais sentido, por exemplo, as faculdades formarem por disciplina. É preciso se alinhar a esse novo ensino médio, assim como precisam de alinhamento os materiais didáticos e o Enem”, pontua a especialista.

Foco da formação muda de conteúdos para habilidades

A aprovação de um modelo de ensino médio diferenciado ainda não completou um ano, mas, ao longo de 2019, a reforma dessa etapa de formação tem sido pauta permanente nas instituições e traz uma forte preocupação: a avaliação.

Conselheiro do Sindicato das Empresas Particulares de Ensino (Sinepe), Eduardo Costa Gomes ressalta que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), aprovada em dezembro passado, ainda não tem tempo de vigência suficiente para que as escolas já pensem na sua aplicação.

“O momento agora é de estudo para os gestores e educadores, de pensar a proposta de construção do novo currículo. Afinal, muda a ênfase da formação, do conteúdo para habilidades, e isso é uma mudança grande para a maioria das escolas”, observa.

Foto: Maxime Centro educacional/ Divulgação
NA MESA: O Maxime, em Guarapari, afirma que tem feito sua parte, envolvendo-se no debate para construção do novo ensino médio. Foto: Maxime Centro educacional/ Divulgação

Nesse contexto, Eduardo Gomes afirma que o ponto-chave é a indefinição sobre como será cobrado o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Afinal, a avaliação está montada para o atual formato de ensino.

“Isso acaba gerando muita angústia: tem o novo currículo, ênfase numa didática diferente e modelo de avaliação ao final. Estamos em fase de estudos, mas aguardamos ainda mais informações, principalmente sobre como operar, mas não temos tido retorno”, afirma o conselheiro do Sinepe, numa referência ao Ministério da Educação (MEC).

Questionado, o órgão federal disse apenas, por meio da assessoria, que mudanças no Enem ainda são avaliadas.

Eduardo Gomes frisa que a implantação na rede particular está sendo bem planejada para os próximos três anos, e as escolas não vão correr para fazer as mudanças de qualquer maneira.

“Cada uma tem sua realidade, vai seguir seu ritmo. Como sindicato, temos um papel de auxílio para aquelas que não conseguirem avançar sozinhas nos estudos e na elaboração do currículo”
Eduardo Gomes, conselheiro do Sinepe

Para Pedro Lucchi, sócio-proprietário do Maxime Centro Educacional, em Guarapari, indefinições por parte do governo federal são uma preocupação, mas ele ressalta que a instituição tem feito sua parte, envolvendo-se no debate para a construção do novo ensino médio na unidade.

“Somos parceiros da rede Pitágoras há 28 anos, com uma pedagogia forte por trás, e nos nossos encontros pelo país, participando de congressos, temos discutido a implantação da BNCC e as mudanças na educação básica”, afirma.

Apesar de o processo para as alterações ainda estar no início, Pedro considera fundamental promovê-las nesta etapa da formação. “O ensino médio como está estruturado hoje no país não é motivante para os adolescentes. A proposta é mudar e torná-lo mais interessante. Em alguns casos, o jovem poderá sair até com uma profissão técnica”, finaliza.

Rede pública do ES tem 17 escolas com “projeto de vida”

Com o prazo de implementação até 2022, o novo ensino médio já começa a ganhar contornos na rede pública do Estado. Atualmente, há 17 escolas-piloto que implementaram a disciplina “projeto de vida” e as eletivas (temáticas). As unidades recebem recursos do Ministério da Educação (MEC) para realizar a mudança na estrutura escolar.

Ao mesmo tempo, na Secretaria de Estado da Educação (Sedu), uma equipe técnica se debruça na elaboração do novo currículo para a rede, a partir da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

Foto: Sedu/Divulgação
A EEEM Irmã Maria Horta é uma das 17 escolas-piloto com disciplina “projeto de vida” e eletivas. Foto: Sedu/Divulgação

A expectativa é ficar pronto até este mês para que, no próximo ano, algumas escolas na região metropolitana, também como piloto, comecem a colocar em prática os itinerários formativos. Pelo cronograma, em 2021 as mudanças serão levadas a mais unidades para que, em 2022, todas estejam contempladas.

Essa organização por etapas é, segundo o secretário Vitor de Angelo, uma estratégia para que sejam feitos ajustes em caso de necessidade. “Só vamos aprender com possíveis erros, acertos, dificuldades, potencialidades na hora de implementar. Então, é preciso diluir isso no tempo”, argumenta.

O secretário ressalta que, a despeito das dificuldades de implementação, o novo ensino médio é uma tentativa ousada, mas necessária. “Devo dizer também que os problemas do ensino médio não são causados somente nesta fase. É um acúmulo de desafios das etapas anteriores, e que não se corrigirão sem investimento na educação infantil e no ensino fundamental também.”

Fique por dentro
Entenda as mudanças no ensino médio

  • A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento que orienta as redes de ensino a preparar seu próprio currículo, mas levando em conta conteúdos obrigatórios para todo o país.
  • A BNCC também é referência para a formação de professores e para a elaboração do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). As mudanças na avaliação, no entanto, ainda estão em discussão no Ministério da Educação (MEC).
  • Além de conteúdos obrigatórios, o novo ensino médio apresenta como novidade os itinerários formativos relacionados às áreas de conhecimento (Matemática, Linguagens, Ciências Humanas e Ciências da Natureza) e também à formação técnica e profissional.
  • O novo ensino médio inclui no currículo uma parte flexível, em que os alunos vão poder escolher os itinerários com os quais têm mais afinidade para completar sua formação.
  • A jornada escolar também vai aumentar, passando das atuais 2,4 mil horas para 3 mil, ao longo dos três anos do ensino médio. E as turmas de tempo integral devem ter, no mínimo, 7 horas por dia.

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