O comprometimento com a formação cidadã dos alunos é um dos diferenciais das cooperativas educacionais, que investem em projetos sociais que ultrapassam os muros das unidades escolares
Imagine uma escola que ofereça educação de qualidade, a um preço justo. Nessa escola são os pais que tomam as decisões, pensando sempre no melhor para os seus filhos. Parece sonho – e há pouco tempo era, até que algumas famílias se uniram e decidiram elas mesmas construírem a escola que melhor representava seus anseios.
Assim surgiram, no Estado, as primeiras cooperativas educacionais – escolas concebidas por pais e que têm, como princípios, o espírito de colaboração e de solidariedade, combinados à gestão compartilhada.
Atualmente, há oito unidades instaladas em municípios do interior – Santa Maria de Jetibá, Linhares, São Mateus, Muqui, Alegre, Pinheiros, Venda Nova do Imigrante e São Gabriel da Palha -, que foram criadas em meados da década de 1990, período em que as greves eram frequentes na rede pública.
Em Venda Nova, há 19 anos a Cooperativa Regional de Educação e Cultura (Coopeducar) começou, por meio da organização de 40 pais. “Quem manda, quem administra, são os pais cooperados”, aponta José Adelso Viçosi, diretor da unidade que atende da educação infantil ao ensino médio e, em parceria com uma faculdade particular, ainda funciona como um polo de Educação a Distância (EAD).
A área pedagógica investe em projetos voltados para a coletividade. Uma das ações dos alunos visa a recuperação da nascente no entorno do Hospital Padre Máximo, com limpeza do terreno e plantio de espécies nativas.
Essa dinâmica escolar é um atrativo, na avaliação de Amanda Zaqui Milagre, 17 anos, aluna da 3ª série do ensino médio. Ela ingressou na cooperativa no 9º ano do ensino fundamental, e logo percebeu a distância que havia entre o modelo cooperativista em comparação à formação que havia recebido até aquele momento.
“Vim de uma trajetória de escola pública e, quando optei pela Coopeducar, foi muito em função do trabalho de integração social e de projetos voltados para o meio ambiente. Acredito que a escola tem a preocupação com a formação do aluno como um todo.”
Nas cooperativas educacionais, como a Coopesma, de São Mateus, são os pais – os cooperados – que decidem como serão aplicados os recursos disponíveis
Valores
O professor universitário José Mauro de Sousa Balbino, 60 anos, tem uma filha, Mariana, que está fazendo o 3º ano do ensino médio na cooperativa de Venda Nova, onde ingressou na educação infantil. A mais velha, Juliana, também passou por lá e hoje é dentista. Para ele, além da qualidade do ensino, a valorização do espírito de cooperação e de cidadania é o diferencial.
Balbino cita como exemplo um projeto sobre destinação adequada de resíduos que, além de tratar o aspecto ambiental, ainda teve uma abordagem social, com o envolvimento da associação de catadores da região.
Diretora pedagógica da Cooperativa Educacional de Linhares (CEL), Queila Gomes Zorzanelli, destaca que os bons valores do cooperativismo norteiam todo o trabalho. “Não é só o cognitivo que importa. Trabalhamos questões como ajuda mútua, democracia e equidade.”
A diretora pedagógica da Cooperativa Educacional de Muqui (Coopem), Katiuscia de Meneses, acrescenta que a intenção é despertar essa preocupação com a comunidade.
Para ingressar em uma dessas unidades, todo responsável pelas crianças e adolescentes se torna cooperado. Os pais participam de assembleias e têm poder de decisão sobre como os recursos vão ser investidos.
“Uma das vantagens é a gente realmente poder opinar. A cooperativa estimula um envolvimento maior dos pais”, avalia Elaine Carvalho de Azevedo, uma das mães da Coopem.
O presidente da Cooperativa Educacional de São Mateus (Coopesma), Erickson Manete de Paulo, ressalta que essa participação das famílias faz toda a diferença.
“Aqui, os pais têm voz e vez. Realizamos duas assembleias gerais a cada ano. São feitas prestações de contas e discutimos a aplicação dos recursos. Todos têm oportunidade de participar do processo decisório. E as sugestões são acolhidas e debatidas.”
A unidade está implantando o sistema de energia solar e estima uma economia mensal em torno de R$ 10 mil na conta de luz. No final do ano, o valor que sobrar – pouco mais de R$ 100 mil – será investido em melhorias, que serão decididas pelos cooperados.
“Aqui, os pais têm voz e vez. São feitas prestações de contas e discutimos a aplicação dos recursos. E as sugestões são acolhidas e debatidas” Erickson Manete de Paulopresidente da Coopesma
Uma das características das cooperativas é o currículo diferenciado: a Coopeducar incentiva a preservação do meio ambiente
Custo reduzido
Outro aspecto atrativo nas cooperativas escolares é o preço que se paga para ter esse modelo de educação. Como são instituições sem fins lucrativos, o custo para estudar em uma cooperativa é reduzido. O termo correto nem é mensalidade, mas rateio.
“Aqui, temos desde pais que trabalham na roça a médicos e empresários. A cooperativa tem esse princípio de não fazer diferenciação de ninguém, e ensina isso aos alunos. O valor que é cobrado atende tanto um quanto outro”, afirma José Adelso, da Coopeducar.
PLACAR
2 mil alunos estudam em cooperativas educacionais no Estado, segundo a OCB/ES
A relação entre cooperativismo e empreendedorismo esteve em discussão no Painel Cooperar
2019, que reuniu representantes de cooperativas de diversos segmentos que atuam no Estado
As cooperativas mirins reproduzem todo o processo de criação das grandes organizações, disseminando entre os estudantes importantes conceitos como empreendedorismo e liderança