A publicidade é uma das principais ferramentas de construção de marca. É por meio dela que uma empresa constrói sua identidade, cria afinidade com os clientes e comunica seus valores. Em uma sociedade na qual o público busca por marcas que proporcionem experiências e transformações, crescem estratégias de engajamento com responsabilidade social.
“Não basta mais a marca participar da vida das pessoas; elas precisam ajudá-las a viverem bem e em sociedade. O público quer uma marca que se importe com suas causas, que consiga fazer a diferença”, afirma Fernando Manhães, especialista em Marketing e Publicidade e professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
De acordo com a diretora da Agência Criativa, Flavia Veiga, pesquisas mostram que 95% das pessoas preferem comprar produtos de empresas com engajamento social ou ambiental. “O consumidor não aceita mais ver uma informação ser empurrada goela abaixo. Com isso, as empresas passaram a usar a força do marketing para se engajar em causas relevantes.”
LEGIMITIDADE
Na análise da diretora digital da Aldeia Marketing de Conteúdo, Suellen Berger, ao escolher uma causa, as marcas devem levar em conta se aquilo faz parte da essência da empresa, desde os funcionários, até os colaboradores e a gerência. “É preciso ser aquilo que você vende, os valores que compartilha.”

Para Fernando Manhães, uma ação só tem sucesso quando a causa é legítima, nasce com a empresa e transmite verdade. Caso seja simples estratégia, os resultados não serão obtidos. “A empresa, quando escolhe uma ação, precisa considerar algo que é a sua realidade, que ela realmente representa. Assim, fica mais fácil se comunicar com o cliente, persuadi-lo e atraí-lo.”
Um dos grandes exemplos atuais de engajamento com o público é a rede de fast-food Burger King. A marca é conhecida por se posicionar politicamente e abordar temas considerados tabus, como diversidade sexual e poliamor. A head de Comunicação e Inovação do Burger King, Thais Nicolau, comenta que as causas são escolhidas com base em discussões internas que transmitem a verdade da marca.

“Buscamos sempre abraçar questões importantes que estão conectadas com a nossa estratégia, apropriando-nos de assuntos que estão rolando no momento para promover debates e reflexões. Sabemos que é assim que conseguimos conversar com o nosso público-alvo, não só de forma vertical, mas também entrando realmente nas conversas de bar dele”, comenta Thais.
CRISES
“Uma vez que uma marca escolhe uma ação, ela não pode mostrar fragilidade no funcionamento”, ressalta Suellen Berger. Para a diretora digital, eventuais crises podem surgir quando uma marca se posiciona em uma discussão. Por isso a importância de se promover ações que fazem parte da realidade da empresa. Suellen cita o exemplo da marca Leite Ninho, que já foi acusada nas redes sociais de não usar leite de vaca no produto. Rapidamente, a marca criou uma campanha que contava a história das pessoas que trabalhavam nas fazendas de produção de leite e mostrava, para o consumidor, por meio de um código de barras, de onde vinha o leite de cada lata de Ninho produzida. “Eles forneceram ao público algo extremamente importante, a transparência. Ao fazer isso, mostraram que os consumidores podem confiar na marca.”
É PRECISO OUSAR
“As marcas mais lembradas são as que são corajosas, que se arriscam e não ficam em cima do muro diante de temas importantes para a sociedade”. A afirmação do coordenador do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Vila Velha (UVV), Bruno Franqueira, é sobre um dos grandes erros cometidos pelas empresas: o de não se posicionar. “O público não quer só um produto para consumir; quer também se sentir representado. A marca que abraça uma causa legítima constrói uma conexão maior com os consumidores e seu dia a dia.”
Ficar em cima do muro nem passa pela cabeça do Burger King, que não perde a chance de discutir temas polêmicos e, muitas vezes, é criticado por tal conduta. Thais Nicolau afirma, porém, que isso não muda o posicionamento. “Vemos como maior risco campanhas que não são faladas e não trazem reflexão ao consumidor. E isso impacta diretamente o que as pessoas esperam de nós. O importante é levantar discussões que contribuam de alguma forma para a evolução e o amadurecimento da sociedade.”

Recentemente, o Burger King lançou uma campanha de recrutamento ironizando o veto do presidente da República, Jair Bolsonaro, à publicidade feita pelo Banco do Brasil que abordava a diversidade. Nas redes sociais, a marca informou que estava recrutando pessoas que tinham “participado de um comercial de banco que tenha sido vetado e censurado nas últimas semanas”. Após a publicação, a rede de restaurantes virou alvo de campanha de boicote no Twitter, mas também recebeu apoio de inúmeros consumidores.
“Para nós, o mais importante é levantar discussões que contribuam para a evolução e o amadurecimento da sociedade. Mesmo recebendo críticas, o mais importante e gratificante é lermos um comentário agradecendo por estarmos trazendo esses assuntos para discussão”, avalia Thais.