Figura conhecida em Santa Teresa, a merendeira aposentada Lídia Regina Zonta, 77 anos, ia toda semana para a Grande Vitória acompanhar algum amigo que buscava atendimento médico em hospitais da Região Metropolitana. Jornadas enfrentadas pela amizade. Porque se fosse pela viagem mesmo… essa história seria bem diferente.
“Saía daqui às 3 horas da manhã, então rodava: ia para o Hospital Dório Silva, para o Jayme, subia até o Santa Rita, Hospital das Clínicas. O último que eles faziam a entrega era o Hospital Evangélico, chegava lá por volta de umas 7 horas. Era um ônibus da prefeitura. E era daqueles ‘pé-duro’, aquele ônibus ruim. Tinha amigos que iam a ortopedista, por causa da coluna, e eu falava ‘vocês vão chegar piores’”, relembra.
Cenas assim se repetiram durante anos porque faltavam especialidades médicas básicas na região onde Lídia mora. Mas essa via-crúcis, hoje, é coisa do passado na vida dela e de tantos outros capixabas: Santa Teresa é um dos municípios do Estado a abrigar uma das unidades da Rede Cuidar, que traz uma nova metodologia de atendimento em saúde pública no Estado e que congrega em si diversas especialidades médicas.
A proposta é reunir ao máximo as etapas de um atendimento em um só local ou região para evitar grandes deslocamentos de pacientes. A metodologia abrange desde unidades de saúde até a rede hospitalar. Mas encontra nas unidades da Rede Cuidar o exemplo máximo desse novo modelo de atendimento.
Hoje são três unidades implantadas: em Nova Venécia, Guaçuí e Santa Teresa. Há previsão de que a de Linhares fique pronta até o final deste ano. A de Domingos Martins, já iniciada, vai ficar para 2019.
As três unidades implantadas já são capazes de atender moradores de 36 municípios do interior do Estado. Na prática, são quase 1 milhão de moradores que não precisam mais se deslocar para a Grande Vitória ao encontrarem disponíveis para si atendimento médico especializado próximo de casa.
Multidisciplinar
O foco desses atendimentos, segundo a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), é a prevenção e tratamento, principalmente, de doenças crônicas. A nova organização do sistema de saúde pública é uma parceria entre governo do Estado e as secretarias de saúde dos 78 municípios do Espírito Santo.
Nas unidades da Rede Cuidar, o paciente é atendido por uma equipe multidisciplinar. No local, ele faz exames, é atendido por médicos, nutricionistas e psicólogos. Tudo num único dia e com horário marcado para evitar idas e vindas que desmotivariam o paciente.
Apesar desse novo capítulo da saúde pública capixaba já ser uma realidade, os grandes deslocamentos ainda estão na memória dos pacientes e trazem uma certeza: a mudança veio para melhorar a qualidade de vida de quem mora longe da Região Metropolitana. “Perdia o dia inteiro lá”, relembra a aposentada Vilma Lúcia de Souza Romanha, 79, moradora de Santa Teresa, que antes da inauguração da Rede Cuidar tinha que se levantar antes de o sol nascer e muitas vezes só voltava para casa, de ônibus, no início da noite.
Chega de viajar!
Dessa história de passar o dia (e a noite) fora de casa por causa da lonjura do tratamento o lavrador Silvio Pereira de Sousa, 64, entende bem. Ele mora em um assentamento no município de Fundão e já precisou muito madrugar para pegar o ônibus da prefeitura que leva o povo para a Grande Vitória.
Mas nenhuma ida foi tão marcante como a primeira vez. “Fiquei pra trás. Cheguei em casa meia-noite. Minha consulta foi à noite e o ônibus foi embora sem mim. Peguei uma circular até a Rodoviária de Vitória e de lá um ônibus pra Fundão. Cheguei lá 10 horas, não tinha táxi, tive que andar seis quilômetros até minha casa”, cita.
E olha que Silvio tinha ido se consultar para tratamento na coluna… Tratamento que hoje ele faz na Rede Cuidar de Santa Teresa, que atende a outros sete municípios. Mesmo local que Vilma faz acompanhamento. “Já fui à ortopedista, médico muito bom também, atencioso. Fiz exame de vista e precisei operar as cataratas. E foi excelente, em pouco tempo já fui operado e já vou colocar os óculos, um atendimento perfeito. E estou muito bem graças a Deus.”
Aliás, a merendeira aposentada Lídia, que tanto acompanhou os amigos nas idas à Grande Vitória, também precisou de atendimento especializado. Mas não teve que fazer o mesmo trajeto. Vivenciou todo o atendimento perto de casa e fez a cirurgia de catarata nas duas vistas no hospital de sua cidade. “Tudo é nota 10. Eu não tenho do que reclamar. Quem falar mal na minha beira, eu brigo”, brinca Lídia.